QUAIS PEDIDOS PODEM SER FEITOS NAS AÇÕES RENOVATÓRIAS?

Por Rodrigo Raja

Nota-se um grande esforço doutrinário e jurisprudencial, dirigido no sentido de que o nomen iuris da actio (o nome que se dá à ação), deve ser analisado conjuntamente com as pretensões (os pedidos) que na ação são deduzidas, a fim de que se permita identificar em qual classe tal demanda irá se enquadrar, estabelecendo as regras de procedimento que deverão ser observadas, quando do trâmite do processo.
Tal esforço se orienta, principalmente, pelo ideal de superação do formalismo exacerbado que já dominou a atuação do Poder Judiciário, em prejuízo da análise dos conflitos de interesses apresentados, e em detrimento da concessão da tutela jurisdicional pretendida.
Ainda que se concorde com tal notável esforço, destinado à superação de barreiras extremamente formais, erigidas em decorrência de falhas na sistemática das regras de processo, recomenda-se que, como em toda e qualquer espécie de flexibilização de regra, se adote extrema cautela. Afinal, a aceitação da relativização de uma regra, sem observar rigorosos critérios, pode torná-la inócua.
Invocando tais ponderações, chama-se atenção para o tratamento que o Poder Judiciário tem dado às pretensões deduzidas nas ações renovatórias de locações não residenciais, regulamentadas pela Lei nº 8.245 de 1.991 – a Lei de Locações.
Como se sabe, as ações renovatórias se destinam à renovação compulsória de contratos de locação não residencial, instrumentalizando o ideal do legislador, de proteção do ponto comercial, estruturado no imóvel locado.
Por tratar-se de uma medida excepcional, eis que impõe a estipulação de uma obrigação de renovação de contrato, ao locador que, em princípio, ostentaria liberdade de contratar, a pretensão de renovação compulsória dos contratos de locação somente deve ser acolhida quando observar-se o atendimento de todos os requisitos estabelecidos nos artigos 51 e 71 da mencionada Lei de Locações, que estabelecem que o locatário de contrato de locação não residencial somente terá direito à renovação compulsória desde que: o contrato a renovar tenha sido celebrado por escrito e com prazo determinado; o prazo mínimo do contrato a renovar, ou a soma dos prazos ininterruptos dos contratos escritos, seja de cinco anos; e o locatário esteja explorando seu comércio, no mesmo ramo, pelo prazo mínimo e ininterrupto de três anos.
O pedido de renovação do contrato de locação não residencial deverá ser instruído com: prova do preenchimento de tais requisitos, e, ainda; prova do exato cumprimento do contrato em curso; prova da quitação dos impostos e taxas que incidiram sobre o imóvel e cujo pagamento lhe incumbia; indicação clara e precisa das condições oferecidas para a renovação da locação; indicação do fiador quando houver no contrato a renovar e, quando não for o mesmo, com indicação do nome ou denominação completa, número de sua inscrição no Ministério da Fazenda, endereço e, tratando-se de pessoa natural, a nacionalidade, o estado civil, a profissão e o número da carteira de identidade, comprovando, desde logo, mesmo que não haja alteração do fiador, a atual idoneidade financeira; prova de que o fiador do contrato ou o que o substituir na renovação aceita os encargos da fiança, autorizado por seu cônjuge, se casado for; e prova, quando for o caso, de ser cessionário ou sucessor, em virtude de título oponível ao proprietário.
Da análise de tais ponderações, nota-se uma série de exigências, por parte do legislador pátrio, condicionantes ao acolhimento do pedido de renovação do contrato de locação não residencial.
Não se observa, no entanto, dentre tais disposições, que o legislador pátrio tenha aberto a possibilidade de que, dentro da ação renovatória, se discuta a validade de cláusulas do contrato objeto de renovação ou se reclame o pagamento de indenização por danos de ordem moral e material eventualmente ocorrentes quando do estabelecimento da relação jurídica de locação.
Tanto é verdade que o próprio legislador cuidou de, no artigo 72 da Lei de Locações, limitar a matéria de defesa da locadora, contra quem se exige a renovação, estabelecendo que ela somente pode suscitar: o não preenchimento, pelo autor, dos requisitos estabelecidos nesta lei; que a proposta de aluguel apresentada pelo locatário não expressa o valor locativo real do imóvel na época da renovação, excluída a valorização trazida por aquele ao ponto ou lugar; ter proposta de terceiro para a locação, em condições melhores; não estar obrigado a renovar a locação (incisos I e II do art. 52).
Isto nos leva a concluir que, especificamente no que diz respeito às ações renovatórias de contrato de locação não residencial, reguladas pelos artigos 71 e seguintes da Lei de Locações, a cumulação de tais pretensões é vedada, destinando-se a demanda renovatória tão somente à renovação do pacto locativo vigente.
Conforme observado pelo MM. Desembargador Jeronymo de Souza, integrante da 3ª Turma Cível do E. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, o rito procedimental a ser observado nas ações renovatórias é especial, regido pelas disposições dos artigos 71 e seguintes da Lei de Locações, observando-se as disposições atinentes ao procedimento ordinário, somente quando o mencionado rito procedimental especial for omisso, como melhor se observa nos trechos de V. Acórdão, abaixo destacados:
“(…) Compulsando a cópia da ação renovatória de fls. 15/43, observa-se, de início, que o agravante, ao invés de indicar de forma clara e precisa as condições da renovação da locação, persegue, entre outros, o afastamento de cláusulas do contrato de locação alegando a existência de vícios, desviando-se da finalidade precípua da ação renovatória que consiste na obtenção de provimento jurisdicional que estabeleça todos os elementos e condições necessários à renovação do contrato de aluguel, embasados em proposta objetiva feita pelo locatário. Na espécie, o recorrente deixou, na verdade, de cumprir a exigência contida no art. 71, inc. IV, a Lei nº 8.245/1991 (…) a ampla discussão das cláusulas ajustadas, como pretendido, desafia ação própria cujo rito não se coaduna com a presente demanda, sabendo-se que a demanda em comento segue procedimento especial (artigos 71 a 75 da referida Lei nº 8.245/1991), aplicado o procedimento ordinário apenas de forma subsidiária quando aquele for omisso (…)” (TJDFT – Agravo de Instrumento nº 20030020032682AGI, Relator: JERONYMO DE SOUZA, 3ª Turma Cível, Data de Julgamento: 23/06/2003)
Se os argumentos a serem deduzidos em Contestação, estão adstritos ao disposto no artigo 72 e incisos da Lei de Locações – justamente em razão da especialidade do procedimento a ser observado para julgamento das ações renovatórias – forçoso admitir-se que não é recomendável que, conjuntamente com o pedido de renovação de contrato de sublocação, se acoste pretensão de discussão de validade de cláusulas do contrato objeto de renovação ou se reclame o pagamento de indenização por danos de ordem moral e material eventualmente ocorrentes quando do estabelecimento da relação jurídica de locação.
Orienta-se, pois, a fim de evitar-se a perpetuação de debates infundados, que se limite os pedidos acostados na ação renovatória à pretensão de renovação do contrato de locação, registrando-se, se o caso, a pretensão de revisão do aluguel.

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